Uso de Localização de Celular Cresce em Ações Trabalhistas, mas Enfrenta Resistência
Apesar de decisão favorável do Tribunal Superior do Trabalho (TST), juristas alertam sobre riscos e recomendam uso proporcional para evitar violações à privacidade.
SÃO PAULO – No início de dezembro (6), um trabalhador foi condenado a pagar multas por má-fé e ato atentatório à Justiça. A decisão ocorreu após o juiz entender que o trabalhador mentiu sobre marcações de horas extras.
Para fundamentar a decisão, o magistrado utilizou dados de geolocalização obtidos de operadoras de celular e do Google. De acordo com especialistas ouvidos pela Folha, o uso desses dados tem se tornado mais frequente em casos trabalhistas com versões conflitantes entre empregado e empregador. No entanto, os juristas alertam que o uso dessas informações deve ser proporcional para não violar a privacidade.
Geolocalização como Prova Chiara de Teffe, professora de Direito Civil e Tecnologia no Ibmec (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais), afirma que a geolocalização pode ser útil em situações específicas. Por exemplo, em ações onde o trabalhador solicita o pagamento de horas extras, a empresa pode requisitar esses dados de operadoras ou do Google. “É uma forma de se obter um dado mais objetivo”, explica. Cabe ao juiz decidir a validade do pedido.
Fabio Chong de Lima, sócio do escritório L.O. Baptista Advogados, observa que o uso de geolocalização é mais comum em processos que envolvem profissionais externos, como vendedores que não trabalham em escritórios. “Por exemplo, o vendedor que alega trabalhar até as 22h, mas a empresa solicita os dados para confirmar essa informação”, afirma.
Resistências e Críticas Pedro Saliba, advogado e pesquisador da Associação Data Privacy Brasil, argumenta que dados de operadoras ou Google não deveriam ser usados. “Esses dados são de uso privado. Quando o dispositivo é corporativo, a empresa pode utilizar o registro de ponto digital, já que o aparelho pertence a ela”, ressalta.
Saliba também aponta que existem alternativas mais adequadas, como aplicativos de registro de ponto, inclusive para trabalhadores externos. Ele classifica o uso de dados de geolocalização como desproporcional, pois esses dados não foram coletados para essa finalidade.
Decisão do TST Em maio, o TST validou o uso da geolocalização como prova em um caso envolvendo a jornada de trabalho de um bancário. A decisão reverteu uma liminar que impedia o Santander de usar esses dados para comprovar a jornada. O bancário solicitava pagamento de horas extras. O colegiado concluiu que a prova era adequada, necessária e proporcional, sem violar o sigilo de comunicações garantido pela Constituição de 1988. A utilização da geolocalização foi limitada aos horários indicados pelo trabalhador.
Segundo o relator, ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, a produção de prova digital está amparada por normas como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a Lei de Acesso à Informação e o Marco Civil da Internet, que permitem o acesso a dados pessoais em situações específicas.
Fonte: Folha de São Paulo